Sacudindo a poeira, ela decidiu empreender fazendo faxina

Por Maria Teresa Lazarini

Ex-atendente de telemarketing, Veronica Oliveira hoje é proprietária do Faxina Boa, empresa de limpeza que já fez parcerias com marcas como Facebook, Twitter e Bradesco

Veronica Oliveira, do Faxina Boa

Aos 35 anos, Veronica Oliveira teve de sacodir a poeira para enfrentar problemas de saúde. Em 2016, ela ficou internada por um mês  em uma clínica psiquiátrica por tentativa de suicídio. O diagnóstico foi depressão e transtorno de ansiedade generalizada, um distúrbio psíquico de ansiedade intensa e permanente que interfere nas atividades diárias. Na época, Veronica era atendente de um laboratório, ganhava menos de R$ 1.000 por mês e dividia uma pensão com mais 40 moradores. Tirando todas as despesas que tinha, faltava dinheiro para ela e os dois filhos comerem. Durante a recuperação na clínica psiquiátrica, ela ouviu o conselho de um médico: “você precisa pensar no que fazer quando sair daqui”.

Ao sair da clínica psiquiátrica, ela tinha apenas R$ 1,70 na conta bancária e teve que ir morar na casa de uma amiga enquanto os filhos ficavam na casa dos avós. Passados quase três anos dos dias mais sombrios de sua vida, Veronica conta para o Vida de Dono que decidiu mudar de vida empreendendo pela faxina.

“Assim que cheguei na casa da minha amiga, limpei a casa. Pensei assim: ‘vou ficar dormindo aqui e não quero ficar na casa bagunçada, né?'”, diz Veronica. “Quando terminei, minha amiga falou que ia me dar R$ 150, que era o que ela pagava para a faxineira. Então, pensei: ‘é isso!, a minha vida muda se eu ganhar todo dia R$ 150’”, concluiu.

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Varrendo o fundo do poço

Foi com vassoura, pano de chão, balde e muito esforço que Veronica limpou o passado e fez o futuro brilhar ao criar o Faxina Boa, a sua empresa de limpeza que já fez parcerias com marcas como Facebook, Twitter e Bradesco. No início, ela começou trabalhando na casa das amigas, mas percebeu que para ganhar mercado precisaria divulgar o seu serviço. Fugindo dos anúncios tradicionais de faxineiras – que para ela costumam ter um tom negativo –, a empreendedora aproveitou a onda de filmes e séries que bombavam em 2016 para chamar a atenção. Com seu celular pré-pago sem crédito, a faxineira usou o Wi-Fi de uma padaria para publicar no Facebook a primeira propaganda. No dia seguinte, a publicação já tinha mais de 3 mil curtidas. Dois dias depois, a TV Record perguntou se ela topava fazer uma entrevista.

Fonte: Facebook Faxina Boa

Mesmo com poucos recursos, a criatividade fez a diferença para o Faxina Boa. Foi só o anúncio “Better Call Veronica!” aparecer na televisão que o telefone da empreendedora não teve mais sossego. Ela conta que, em cerca de um minuto, recebeu mais de 400 mensagens no WhatsApp. Pensando na exposição que estava atraindo e no poder da comunicação, Veronica decidiu criar uma página própria no Facebook para divulgar seu trabalho e contar mais sobre a rotina de uma faxineira e as dificuldades vividas.

O Faxina Boa foi criado com o propósito de falar sobre o empoderamento das diaristas e a rotina de trabalho de uma profissional de limpeza. Hoje, a página na rede social conta com mais de 73 mil curtidas e também está presente no Instagram e no Twitter.

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Superando o preconceito

Apesar de os anúncios de Veronica terem arrancado elogios na internet, ela ainda teve de enfrentar muitos comentários preconceituosos – não só dos internautas, mas também de amigos. Por ter crescido em um bairro nobre de São Paulo, era comum ouvir observações que desvalorizassem as faxineiras.

“Eu ouvia coisas como ‘Nossa, você não tem vergonha [de ser faxineira]?’, ‘você não acha estranho?’. E respondia: ‘vergonha do quê, cara? Eu tava passando fome! É obvio que eu não tenho vergonha, eu tô feliz para caramba!’”, diz a proprietária do Faxina Boa. “Foi aí que eu percebi que as pessoas não só tinham dúvida, mas também muito preconceito com faxineiras.”

Pela sua história e pelos diversos relatos que recebe sobre as dificuldades da profissão, Veronica almeja dar maior visibilidade e voz para faxineiras e diaristas. Apesar de o trabalho doméstico responder por 6,8% dos empregos no País, de acordo com um estudo do Ministério do Planejamento com a ONU Mulheres, a proprietária considera que ainda falta representação das profissionais e conhecimento sobre o ofício. Por isso, como próximos passos, a empreendedora pretende criar, a partir do Faxina Boa, um meio de profissionalizar faxineiras para valorizar a função.

“Tudo o que eu mais queria veio quando eu comecei a fazer faxina”, afirma Verônica que, depois de abrir a sua empresa, realizou sonhos como viajar de avião para ver sua banda favorita Tool tocar ao vivo.

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Como Veronica deixou o Faxina Boa brilhando

Fonte: Facebook Faxina Boa

Encantados com os anúncios criativos de Veronica, muitos publicitários contrataram a faxineira para limpar a casa e acabaram abrindo mais portas para seu negócio, oferecendo cursos de marketing digital, redes sociais e produção de conteúdo. Com isso, a empreendedora começou a entender um pouco mais sobre o que era ser proprietária de um negócio, além de expandir seu networking.

As oportunidades de trabalho para Veronica cresciam junto com a popularidade do Faxina Boa. Além de fazer faxinas durante a semana, que custavam R$180 a diária, a proprietária começou a dar palestras para grandes marcas, como Twitter e Google, e fez até um comercial para o Bradesco. Com o desenvolvimento do Faxina Boa, as demandas de trabalho de Veronica também aumentaram.

Além das faxinas, contato com clientes e programação de palestras, ela ainda tinha de estudar sobre empreendedorismo, produzir conteúdo para as redes sociais e cuidar dos filhos. Buscando otimizar os processos, a dona do Faxina Boa resolveu delegar os serviços de faxina para uma moça que confiava. Assim, a proprietária teria mais tempo de gerenciar a marca e alavancar seu crescimento.

Diferentemente de aplicativos e sites que ficam com quase metade do pagamento da faxineira, a funcionária de Veronica recebe cerca de 80% do dinheiro. Quando o cliente paga R$ 180 pela limpeza, a empreendedora retém apenas R$ 30.

Registrada como Microempreendedora Individual (MEI), a entrevistada do Vida de Dono diz que abrir uma empresa ainda é um processo muito burocrático que necessita de paciência e estudo.

“Além de eu ser meu próprio RH, meu próprio atendimento, meu próprio tudo, eu também tive que entender que o que as empresas pagavam de impostos agora sou eu quem tenho que pagar. Foi esquisito até entender tudo isso”, afirma a proprietária do Faxina Boa.

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Uma mão lava a outra

Com mente empreendedora, Veronica Oliveira diz que as mulheres e pequenas empresas devem se ajudar. Ela tenta ao máximo comprar produtos e serviços de mulheres. De compra de roupas artesanais aos serviços de pintura de parede, ela diz que sempre contrata mulheres – justamente para ajudar outras empreendedoras a crescer.

Além de estimular o empreendedorismo feminino, Veronica também aproveita para fazer parcerias com empresas que estão começando, assim como a Faxina Boa. Uma delas é a YVY Brasil, uma startup de produtos naturais de limpeza comercializados via assinatura. Enquanto Veronica faz divulgações dos produtos em suas redes, a YVY auxilia a empreendedora com serviços como suporte jurídico. Como ela mesma diz sobre as colaborações, as pequenas empresas devem se apoiar.

No espírito de “uma mão lava a outra”, Veronica planeja expandir o Faxina Boa para auxiliar outras faxineiras a terem boas condições de trabalho. A partir de relatos que ela recebe dessas profissionais, que vão desde falta de contrato empregatício à humilhação no local de trabalho, ela percebeu que ainda há muito a ser feito. Além de ajudar as moças com o conteúdo específico, ela planeja oferecer profissionalização.

“Eu gostaria de estruturar uma forma de juntar essas meninas e fazer um curso que tivesse uma certificação. Aí essa menina aprenderia a cobrar de forma justa e ter um horário certo para que a profissão melhore”, diz a empreendedora.

Aos 38 anos, Veronica tem uma agenda cheia de compromissos, que incluem palestras, produção de conteúdo para as redes do Faxina Boa e faxina. Mas não para por aí. Depois de passar por uma pensão e dividir apartamento com a amiga, hoje Veronica cuida da sua própria casa, em São Paulo, onde vive com os dois filhos, de 10 e 19 anos, e o marido. Ao contrário do passado, sua rotina de trabalho não provoca mais traumas.

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